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Afinal, para que serve um sommelier de cerveja?

Juliana Simon

21/03/2021 04h00

(Crédito: iStock)

Não precisa fazer muito esforço, basta "dar um Google", para saber que uma das principais perguntas sobre o tema "sommelier" é "qual a sua função". E já não é uma dúvida somente no que se refere ao mundo dos vinhos, ainda cercado de muitos mitos sobre ser uma bebida elitista, dificílima, caríssima e etc…

Hoje, "viver de analisar bebidas" extrapolou para cervejas, cachaça e saquê e, na última semana, a profissão ficou ainda mais distante de papo de bar e mais oficial. Os profissionais destas três outras bebidas foram reconhecidos na Classificação Brasileira de Ocupações, como mostra este post da Abracerva.

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Um caminho para reconhecimento e valorização, sem dúvida, mas o que isso quer dizer agora? Na prática?

Difícil encontrar tranquilidade na estampa de sommelier, convenhamos. Não há como negar que é uma categoria ainda bastante antipatizada – lembrai que a palavra sommelier se tornou sinônimo de pessoa mala, que dá pitacos não-solicitados sobre qualquer coisa.

Por outro lado, é um campo das vaidades, em que, para muitos, basta um diploma para ser coroado "entendidão" e forçar goela abaixo a necessidade de seus conhecimentos para a existência da cerveja. Puro mito.

De qualquer forma, nem sempre fica claro quais são as funções e ambições de quem procura a profissão e os cursos que treinam para ela.

"Sommelier de sommelier"?

"Água, malte, lúpulo, levedura e conhecimento". Desde meu primeiro dia nesse universo, lá em agosto de 2015, sabia que não almejava muito além disso. Tinha gente que queria abrir bar, ser promovido no trabalho da cervejaria grande, bombar a cervejaria caseira… outros nem imagino – talvez estivessem investido em um curso pra encher o saco de família, amigos e garçons, ou só encher o caneco em horas de degustações.

(Já contei aqui como tive aquele "PLIM" para procurar esse caminho e as coisas evoluíram de forma que combinei a profissão antiga e amada – jornalismo – com a nova e sem pretensões de ganha-pão – sommelieria)

O que iguala todo mundo na profissão-sommelier é a capacidade (ou a tentativa de) de transmitir conhecimento cervejeiro. Com um diploma na mão, de uma escola de qualidade, é a responsabilidade de passar para o freguês, o consumidor, o leitor tudo o que dê mais prazer em beber cerveja boa – inventar regras ou martelar decoreba de escolas cervejeiras e IBUs por aí não surte esse efeito, acreditem.

Outro detalhe que se perde na infinidade de profissionais da área é, na verdade, a base de tudo: aprender e ensinar a degustar.

E para isso, meus amigos, não dá para ficar "bem louco", não dá para confundir estudo com (apenas) "horas copo" – uma brincadeira com "horas de voo" para virar piloto, quanto mais melhor.

Se sua referência cervejeira é o beberrão que termina um papo cervejeiro de joelhos, a diversão pode ser imensa, mas saber mesmo sobre cerveja é zero. Se seu "sommelier de confiança" não promove o consumo responsável, já dá para entender que você pode aprender mil truques contra a ressaca, mas não vai sair com uma gota de informação sobre o que está bebendo.

Área nada democrática

Cervejas artesanais são caras (as referências gringas das escolas todas então, nem se fala), livro sobre cerveja também, curso cervejeiro idem.

É verdade que hoje pipocam cursos mais baratos, bolsas, educação cervejeira voltada para quem vem de classes menos privilegiadas, mas AINDA não é o suficiente para tornar a profissão sommelier menos elitista, nem o conhecimento cervejeiro menos nichado.

A solução para isso? Não tenho fórmula mágica, mas tenho sugestões.

Democratizar a cena cervejeira também é "vender" conhecimento com o pé mais no chão, para um público que não bebeu "aquela-cerveja-referência-da-escola-belga-direto-da-torneirinha-da-fábrica". E isso está nas mãos de comunicadores em uma parte (acorda, influencer), mas não só.

Cervejarias artesanais brasileiras, podemos falar de cerveja sem constranger o neófito? O que não tolera, ainda, altíssimos IBUs, aventuras ácidas, envelhecimentos em madeira, lactose e afins? Podemos dar aquele carinho para quem estacionou na lógica do "puro malte"?

Que tal não nos restringirmos às tendências? Que tal realmente aproveitarmos espaços para todos (oi, tem um blog num portal grande aqui) para esfregarmos essa paixão cervejeira na cara de cada pessoinha do mundo?

São ideias, utopias, e um certo desespero de ver pra saber pra que, afinal, servem os sommeliers.

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Sobre a autora

Juliana Simon é jornalista do UOL, sommelière de cervejas, mestre em estilos e especialista em harmonização pelo Instituto da Cerveja Brasil.

Sobre o blog

O Siga o Copo é espaço para dicas, novidades e reportagens para quem já adora ou quer saber mais sobre o universo cervejeiro e de mais bebidas.